sábado, 28 de fevereiro de 2015

OS VERSOS QUE TE FIZ, de Florbela Espanca

Deixe dizer-te os lindos versos raros

Que a minha boca tem pra te dizer !
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim pra te oferecer.

Tem dolencia de veludo caros,
São como sedas pálidas a arder...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos pra te endoidecer !

Mas, meu Amor, eu não te digo ainda...
Que a boca da mulher é sempre linda
Se dentro guarda um verso que não diz !

Amo-te tanto ! E nunca te beijei...
E nesse beijo, Amor, que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

SOLIDÃO, por Chico Buarque de Hollanda

Solidão não é a falta de gente para conversar,
namorar, passear ou fazer sexo...
Isto é carência!

Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência de entes queridos que não podem mais voltar...
Isto é saudade!

Solidão não é o retiro voluntário que a gente se impõe, às vezes, para realinhar os pensamentos...
Isto é equilíbrio!

Solidão não é o claustro involuntário que o destino nos impõe compulsoriamente para que revejamos a nossa vida...
Isto é um princípio da natureza!

Solidão não é um vazio de gente ao nosso lado...
Isto é circunstância!

Solidão é muito mais do que isto!
Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos
e procuramos em vão pela nossa alma!

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

SONETO DE FIDELIDADE, de Vinícius de Moraes



De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento


Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento


E assim quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama


Eu possa lhe dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama 
Mas que seja infinito enquanto dure.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

AUSÊNCIA, de Carlos Drummond de Andrade

Por muito tempo achei que a ausência é falta.

E lastimava, ignorante, a falta.

Hoje não a lastimo.

Não há falta na ausência.

A ausência é um estar em mim.

E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,

que rio e danço e invento exclamações alegres,

porque a ausência, essa ausência assimilada,

ninguém a rouba mais de mim.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

SAUDADES, de Florbela Espanca


Saudades! Sim.. talvez.. e por que não?...
Se o sonho foi tão alto e forte
Que pensara vê-lo até à morte
Deslumbrar-me de luz o coração!

Esquecer! Para quê?... Ah, como é vão!
Que tudo isso, Amor, nos não importe.
Se ele deixou beleza que conforte
Deve-nos ser sagrado como o pão.

Quantas vezes, Amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar
Mais decididamente me lembrar de ti!

E quem dera que fosse sempre assim:
Quanto menos quisesse recordar
Mais saudade andasse presa a mim!

Florbela Espanca, in "Livro de Sóror Saudade"

domingo, 15 de fevereiro de 2015

AMAR TEM QUE SER FÁCIL - por Rafael Magalhães

Não sei se vocês vão gostar, mas eu simplesmente amei esse texto. Me identifiquei com ele e espero que vocês também se identifiquem. E EU SUPER RECOMENDO ESSE BLOG.
http://www.precisavaescrever.com.br/



Amar tem que ser fácil. Se é amor, tem que fazer bem. Se não faz, pode ser qualquer coisa, menos amor. Manter um relacionamento deve ser algo natural e prazeroso. Casais que precisam se esforçar muito, que se desgastam demais e que abdicam tudo de si pelo outro, não tem como funcionar. Tanta cobrança, tanta mágoa, tanto maltrato, tudo isso por quê? Medo de ficar sozinho(a)? Sentimento de posse? Carência? Falta de amor próprio? Comodismo? Um pouco de tudo isso talvez. Claro que todo relacionamento requer uma boa dose de dedicação e comprometimento e que quando você se envolve com alguém automaticamente se dispõe a dedicar-se para que a coisa funcione. Mas até onde vai esse limite? Por que abdicar da própria felicidade para manter um relacionamento assim? E que história é essa de que “eu não gosto tanto dele, mas ele faz tudo para mim”? Não sei se vai acreditar no que eu digo, mas te afirmo que dá para ter as duas coisas juntas. Que tal? Na vida aceitamos exatamente aquilo que julgamos merecer. Nem mais, nem menos. Quando a pessoa acha que merece algo melhor do que o que tem, vai atrás e tenta mudar, ou joga fora e busca algo novo. E você? Pare pra pensar! Você tem o que merece? Penso que mereça ser feliz, e que só faz sentido ter alguém ao seu lado que te faça sentir-se exatamente assim. Nem um centímetro a menos. Sem pressão, sem medo, sem paranóia, sem “DR” a todo instante. Com respeito, amizade, naturalidade, companheirismo e cumplicidade. Sem ter que abdicar do que você é para que funcione. Se não for assim não serve, não faz sentido. Não se acomode. Não se contente. Uma porta só deve ser fechada quando tiver absoluta certeza que nada melhor possa passar por ela. Você merece mais! Amar não pode ser algo doloroso. É o oposto disso. Amar tem que ser fácil.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

in CEM SONETOS DE AMOR, de Pablo Neruda

Não te quero senão porque te quero,
e de querer-te a não te querer chego,
e de esperar-te quando não te espero,
passa o meu coração do frio ao fogo.
Quero-te só porque a ti te quero,
Odeio-te sem fim e odiando te rogo,
e a medida do meu amor viajante,
é não te ver e amar-te,
como um cego.

Talvez consumirá a luz de janeiro,
seu raio cruel meu coração inteiro,
roubando-me a chave do sossego,
nesta história só eu me morro,
e morrerei de amor porque te quero,
porque te quero amor,
a sangue e fogo.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

DOIDAS E SANTAS, de Martha Medeiros

Pra começo de conversa, não acredito que haja uma única mulher no mundo que seja santa. Os marmanjos devem estar de cabelo em pé: como assim, e a minha mãe???



Nem ela, caríssimos, nem ela. 

Existe mulher cansada, que é outra coisa. Ela deu tanto azar em suas relações, que desanimou. Ela ficou tão sem dinheiro de uns tempos pra cá, que deixou de ter vaidade. Ela perdeu tanto a fé em dias melhores, que passou a se contentar com dias medíocres. Guardou sua loucura em alguma gaveta e nem lembra mais. 

Santa mesmo, só Nossa Senhora, mas, cá entre nós, não é uma doideira o modo como ela engravidou? (Não se escandalize, não me mande e-mails, estou brin-can-do.) 

Toda mulher é doida. Impossível não ser. A gente nasce com um dispositivo interno que nos informa desde cedo que, sem amor, a vida não vale a pena ser vivida, e dá-lhe usar o nosso poder de sedução para encontrar "the big one", aquele que será inteligente, másculo, se importará com nossos sentimentos e não nos deixará na mão jamais. Uma tarefa que dá para ocupar uma vida, não é mesmo? Mas além disso, temos que ser independentes, bonitas, ter filhos e fingir, às vezes, que somos santas, ajuizadas, responsáveis, e que nunca, mas nunca, pensaremos em jogar tudo para o alto e embarcar num navio pirata comandado pelo Johnny Depp, ou então virar loura e cafetina, sei lá, diga aí uma fantasia secreta. Sua imaginação deve ser melhor que a minha. 

Eu só conheço mulher louca. Pense em qualquer uma que você conhece e me diga se ela não tem ao menos três dessas qualificações: exagerada, dramática, verborrágica, maníaca, fantasiosa, apaixonada, delirante. Pois então. Também é louca. E fascinante. 

Todas as mulheres estão dispostas a abrir a janela, não importa a idade que tenham. Nossa insanidade tem nome: chama-se Vontade de Viver até a Última Gota. Só as cansadas é que se recusam a levantar da cadeira para ver quem está chamando lá fora. E santa, fica combinado, não existe. Uma mulher que só reze, que tenha desistido dos prazeres da inquietude, que não deseje mais nada? Você vai concordar comigo: só sendo louca de pedra.