quarta-feira, 1 de junho de 2016

CALL ME FRIDA, por Fernanda Young




Somos todos um pouco Frida, se já amamos, se já sofremos, se já fomos deixados, traídos, se já traímos. Somos Frida porque somos latinos, passionais, raivosos, ciumentos, possessivos. Uns mais, outros menos. Eu muito, assumo, não pouco constrangida.

Frida Kahlo tornou-se artista por acidente. Alguns são dotados de inspiração, e demonstram suas habilidades ainda cedo. Era o caso de Diego Rivera, amor e mestre criativo de Frida, que desde criança demonstrava uma genialidade estética aprimorada, sendo conduzido bem cedo ao ofício das artes plásticas. Frida era uma menina alegre, atlética, estimulada a ser especial, mas foram as dores do percurso que a inspiraram a criar. Foi o que lhe restou. Após o acidente de bonde, em que teve um ferro penetrando seu sexo, esmagando suas costelas, triturando seu pé, restou olhar um espelho. Sobrou apenas se observar, desenhar-se, escrever, sonhar, sofrer, chorar, desejar mais, e por isso, alcançar tanto.

Quem tem o hábito de fazer auto-retratos muitas vezes é descrito como vaidoso. Assim como os que usam suas experiências para escrever. O artista é julgado como um egocêntrico, quando o que precisa é sobreviver ao caos, ao medo, às carências. O artista que oferece a si, como obra, é antes de mais nada um ser generoso. Mostra a todos o que mais sabe. Frida sabia sobre si, e se ofereceu sem o menor constrangimento. Livre, louca, debochada, beberrona, ofereceu-nos sua dor, e devemos a ela, como a inúmeros outros poetas, nosso olhar e nossas homenagens. Não me fantasio de Frida, e, sim, deixo-a frequentar meu corpo, como que um altar. Deixo que as roupas sejam reverências a essa, que me inspira e me alivia.

Call Me Frida não é sobre mim, ou eu me fazendo de Frida – somos malucos, mas não ingênuos, Nem mesmo deveria ser visto como uma caracterização, pois não fizemos de Frida Kahlo uma personagem. Não estou atuando, usando o talento de Duda Molinos, como muletas para fazer-me de Frida Kahlo. Não chego nem próxima aos seus tortos e machucados pés. Não são as roupas e a composição de Alexandre Herchcovitch que me fantasiam, porque nunca quisemos isso. Nem a luz perfeita de Paulo Ferreira, nem a visão dramática de Bob Wolfenson, poderiam me conduzir a interpretar Frida Kahlo. Seria impossível.

Sou muito Frida porque assumo e exponho minhas dores. E se tenho a chance de fazê-lo de forma tão poética e bela, é porque DUDA, ALE, PAULO, BOB, e todos que se envolveram nesta exposição, reconhecem as suas próprias Fridas, e souberam compor essas imagens com verdade, beleza, e, é claro, paixão.

Esperamos que estas fotos, feitas pelo grupo, com todo respeito, mesmo que sem excluir o humor, sejam olhadas com ternura e inspirem as FRIDAS de cada um. Insisto: todos nós somos um pouco FRIDA: Então, permita-se!

* Texto de Fernanda Young na exposição Call Me Frida. Em dezembro no Lab. Duda Molinos (Higienópolis, SP).

Nenhum comentário:

Postar um comentário